Preacher: HQ x Série


O sucesso de Walking Dead e do CWverso escancarou as portas da televisão para as adaptações de quadrinhos, mas certas coisas a gente não imagina nem de brincadeira que cheguem a sair do papel.

Uma delas é um seriado de Preacher. 

Lembro bem da enorme comoção nerd quando a AMC anunciou uma adaptação da HQ sob a batuta de Seth Rogen e seus amigos lá pelo fim do ano passado. 

Sim, esse Seth Rogen...

Para quem leu a obra seminal de Garth Ennis e Steve Dillon, a apreensão era completamente justificável: como diabos o grau de insanidade de Preacher seria dosado numa série de TV? O que vai sobrar da história original? 

Aí lá pra novembro saíram uns teasers bem furrecas mostrando Jesse Custer e Cassidy como se fossem super espiões e o IVDM (Índice Vai Dar Merda) foi às alturas.

Bom, há algumas semanas a série estreou na grade de domingo da AMC e soma, ao dia de publicação dessa matéria, seis episódios exibidos na gringa. Vamos ver o que caralhas deu tudo isso?


A história




Preacher conta a história de um padre chamado Jesse Custer que, acometido de um enorme poder, resolve cruzar os Estados Unidos com sua ex-namorada Tulipa e seu melhor amigo e vampiro Cassidy em busca de Deus para cobrar satisfações. Nesse ínterim, eles encaram todo tipo de treta que pudesse ter saído da cabeça do Garth Ennis e isso rendeu um punhado de cenas lendárias para se contar numa mesa de bar.

O seriado resolveu mostrar tudo isso, só que ainda não.

Pelo que se pode pescar da trama até agora, tudo na história se encaminha para ter como desfecho a situação das primeiras edições da revista, mas com uma diferença: estão apresentando e desenvolvendo todos os elementos principais da trama antes deles darem as caras na história. Relações de amizade como as de Jesse e Cassidy, a construção da trama inicial da Tulipa e a apresentação dos vilões estão sendo estabelecidas antes da road trip começar.

Um exemplo disso são os flashbacks do Santo dos Assassinos. 


Antes dele ser convocado nos dias atuais, a série optou por apresentar a origem do personagem em pequenas sequências ao início de alguns episódios. Dependendo de como isso for trabalhado, pode dar um efeito muito foda quando ele finalmente confrontar o JC.

Mas, enquanto isso tudo não rola, a história se resume a Jesse fazendo merda com seu novo poder.

Então no quesito história, por enquanto:


HQ 1 x 0 SÉRIE



O ritmo




Como previsto, a história da série não seguiu o ritmo de road trip frenética da HQ.

A história da série sequer é uma road trip, se passando quase que inteiramente na cidade de Salvation, no estado do Texas. Nas HQs, esta cidade aparece na trama lá pela edição 41 e serve apenas de cenário para o arco envolvendo o vilão Odin Quincannon. Já na série, foi estabelecido que ela é a cidade de onde parte toda a trama.

Isso tem um motivo muito claro: custos de produção. Na realidade de séries de TV, o mais comum é estabelecer localidades fixas para cada temporada para, na seguinte, inventarem algum motivo para não irem mais lá como um incêndio, um desmoronamento ou algo do tipo.

Manter os personagens de uma road trip numa localidade fixa fez um mal danado ao ritmo da história quando comparamos ao seu material de origem. Os primeiros episódios inundam os fãs da HQ de referências mas mostram muita pouca coisa acontecendo de fato. Em um episódio, Genesis entra em Jesse Custer, no outro ele descobre que tem poderes, quatro episódios depois descobre do que se trata... enquanto nas HQs tudo isso acontece em três páginas ou menos.

Isso quando ele não tinha sonhos que explicavam a trama

Acho que não preciso dizer mais nada:

HQ 2 x 0 SÉRIE

Os Personagens


Aqui o jogo começa a virar, queridinha.

Com a vantagem de Preacher ter sido concluído há muito tempo, os produtores da série conseguiram ter uma visão geral da história e desenvolver os personagens de acordo com ela. Coisas que Ennis bolou para Jesse, Cassidy e Tulipa ao longo dos anos de publicação já mostram influência nos personagens desde os primeiros episódios e isso gerou protagonistas mais ricos e tridimensionais. Tulipa é um dos casos mais notáveis de upgrade de personalidade: passou de uma ladra de carros e mercenária frustrada chateada por ter levado um pé na bunda para uma mercenária badass chateada porque o ex não quis levar pra frente uma vingança sanguinária com ela.


Que mulher charmosa, bicho!


Já outros personagens neglicenciados pela obra original como os anjos burocratas e o Cara-de-Cu ganharam tramas e personalidades próprias. Inclusive o pai do Cara-de-Cu, que só aparece nas primeiras edições para ser currado por si próprio e depois cometer suicídio, na série é parte importante do enredo.


  Como imagino comentaristas de grandes portais


Cassidy na série é praticamente uma cópia em carbono da versão original, e carrega nas costas o espírito do material original em muitos momentos. Mas o melhor ator, sem sombra de dúvidas, está fazendo o vilão da temporada.

O ODIN QUINCANNON É O ROXAXÁ DO WATCHMEN!


Não sou eu que estou preso com vocês...


Por esses e outros motivos menores:

HQ 2 x 1 SÉRIE

A Arte



Essa categoria é simplesmente uma covardia.

É consenso no mundo mineral que Steve Dillon, o artista da HQ, possui um traço bastante limitado e uma preocupação abaixo da curva com questões estéticas como enquadramento, se limitando a sempre fazer o arroz-com-feijão e, de preferência, com o mesmo rosto pra todo mundo.


Imagem meramente ilustrativa


Já a equipe de direção de arte da série é simplesmente fenomenal. Todos os episódios possuem um tratamento de imagem a nível cinematográfico e tomadas de cair do queixo de tão bem pensadas. Ajuda também o fato de ser um meio audiovisual que a série tenha uma vantagem descomunal ao trazer músicas de Johnny Cash, Margaret Lewis e Willie Nelson em momentos precisos.

Só a abertura da série já é mais bem dirigida que todas as séries de heróis do CW:



HQ 2 x 2 SÉRIE

Mas, e aí? 

E aí que só temos seis episódios ainda pra uma análise maior que essa, então prefiro manter o placar em empate por enquanto. Dependendo dos rumos da série, ele ainda pode mudar bastante.


A série presta?


Presta pra cacete! Além de ser muito bem feita, só tem ator de primeira e é bastante divertida quando não comparada ao material de origem, que deve ter sido uma das coisas escritas em língua inglesa mais divertidas dos últimos tempos. A produção do seriado está reorganizando tudo da HQ numa narrativa própria, mas continua tudo lá.

Além disso, o público civil está gostando tanto que, apesar de disputar horário com Game of Thrones, Preacher se saiu tão bem até agora que já teve sua segunda temporada confirmada e figura entre as séries novas mais populares do momento.

Porém, pra quem esperava uma adaptação fiel da história, a série não vai passar de uma grande decepção. Mas se você tem mais de quinze anos de idade e mesmo assim espera que um canal de TV adapte uma obra do Garth Ennis fielmente em 2016, você merece todo esse sofrimento pra largar de ser otário.

Galera parece que nasceu ontem...


Hasta Luego!

Comentários